quarta-feira, 7 de outubro de 2009

Não gostava de morrer...

...sem voltar a viver aqui.


Quando eu estudava e vivia em Lisboa, num dos fins-de-semana em que vinha a casa, apanhei o autocarro e sentei-me ao lado de uma velhota que, pouco antes, ajudei a carregar as malas. Meteu conversa comigo (como todas as velhotas o fazem). Contou-me sobre a sua vida. Contou-me que sempre foi doente (desde que nasceu). Teve um problema no sangue que a fez levar muitas transfusões de sangue. Disse-lhe que sou dadora de sangue. Ficou comovida e agradeceu-me muito. Falou-me dos seus médicos (em particular da médica que a acompanhou mais de perto de quem é muito, muito amiga). Explicou-me que a doença lhe tolheu as esperanças numa vida normal (motivo pelo qual nunca casou nem teve namorados).
Falou-me do amor da sua vida. A cidade de Lisboa. Viveu lá sempre. Até à doença (nesta altura já eram doenças no plural) se tornar tão incapacitante que não lhe permitia subir as escadas do prédio onde morava e teve de se mudar para uma vivenda no Alentejo, que pertencera a um tio.
Agora apenas ia a Lisboa para as consultas (era o caso desse dia).

Mas de tudo o que me disse, a coisa mais maravilhosa foi aquilo que lhe vem à mente de cada vez que tem de se deslocar a Lisboa. Ao passar a ponte, o seu espírito pensa: "Graças a Deus que ainda vivi o suficiente para vir mais uma vez à minha Lisboa".

Nunca mais vi a velhota. Despediu-se de mim com um abraço, e eu dela com a certeza de que pessoas com sentimentos em uníssono existem.

Hoje em dia, cada vez que passo a ponte sobre o Tejo, o meu espírito diz: Meu Deus, obrigado por poder viver o suficiente para voltar à minha (nossa?) Lisboa!"

Nem toda a gente compreende (ou quase ninguém).
Nem toda a gente concorda (ou mesmo ninguém).

Apenas quem lá viveu... quem percorreu, ouviu, percebeu, conheceu, reconheceu, se impressionou, foi impressionado, cheirou, saboreou, chorou, só quem lá sofreu, só quem lá amou. Só quem SENTIU verdadeiramente a cidade pode adorar Lisboa da mesma forma que eu.

Este fim-de-semana estive lá. O que me avivou a certeza de que só lá conseguirei ser feliz.

2 comentários:

Rosa Cueca disse...

já é mais certeza que eu tenho sobre a minha felicidade e o local onde ela pode acontecer ;)

caditonuno disse...

lisboa não, porto sim!!!